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No Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, TJPE destaca protagonismo das mulheres negras e reafirma compromisso com a equidade racial


 

A luta e a resistência das mulheres negras da América Latina e do Caribe são celebradas mundialmente no dia 25 de julho. No Brasil, a data também homenageia Tereza de Benguela, líder quilombola que desafiou o sistema escravocrata no século XVIII. Mais do que uma celebração simbólica, o momento convida instituições e a sociedade a refletirem e agirem por equidade racial.

Em alusão ao 25 de julho, o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) homenageia todas as mulheres negras que lutam diariamente contra o racismo e pela construção de uma justiça mais equânime e inclusiva. A data marca não apenas a resistência de figuras históricas como Tereza de Benguela ou Maria Firmina dos Reis (ao final deste texto, relembramos algumas dessas mulheres e suas importantes contribuições), mas também o protagonismo atual de mulheres que ocupam espaços estratégicos no sistema de Justiça.

Uma dessas vozes é a da juíza Luciana Maranhão, coordenadora da Comissão de Políticas Judiciárias de Equidade Racial e suas Interseccionalidades (CPJERI) e presidente da Comissão Permanente de Heteroidentificação do TJPE. Em entrevista concedida a este portal, a magistrada compartilhou reflexões sobre os avanços e os desafios da equidade racial dentro do Judiciário pernambucano.

“Estamos aqui porque muitas vieram antes de nós, foram presas, silenciadas, apagadas, mas não cederam. Como mulher negra dentro do sistema de justiça, sei que cada passo meu é também um grito de muitas. Ocupo esse espaço com a consciência de que ele não foi feito para mim, mas que eu o reivindico com toda a ancestralidade que me habita”, destacou a juíza.

Desde sua criação, em 2021, a CPJERI tem promovido ações estruturantes no TJPE voltadas à promoção da equidade racial. Entre os principais avanços estão a elaboração de diagnósticos raciais e interseccionais, a produção de dados sobre o corpo funcional do Tribunal, a interlocução com outros setores do Judiciário e com a sociedade civil, e a proposição de políticas voltadas ao acesso, permanência e ascensão de pessoas negras e indígenas no sistema de justiça. Além disso, a comissão tem atuado no fortalecimento de espaços de escuta e participação como forma de garantir que as vozes historicamente silenciadas sejam ouvidas.

A atuação da juíza também se destaca na presidência da Comissão Permanente de Heteroidentificação, que assegura a aplicação efetiva das cotas raciais no Judiciário. O trabalho realizado tem sido decisivo para o combate a fraudes e para a integridade das ações afirmativas. Um dos marcos recentes foi a implementação da heteroidentificação no Exame Nacional dos Cartórios (ENAC) e no Exame Nacional da Magistratura (ENAM), com validade de quatro anos e aproveitamento recíproco entre os certames. “É uma conquista relevante, porque reconhece o pertencimento racial como critério legítimo de democratização do acesso aos espaços de poder”, afirmou.

Outro ponto de destaque na entrevista foi a conclusão das atividades do Grupo de Trabalho sobre Equidade Racial do TJPE, que entregou uma minuta de política institucional para o enfrentamento do racismo no Judiciário. O documento propõe metas, diretrizes, políticas de formação, reconhecimento e um canal interno de denúncias sobre racismo institucional, garantindo um espaço seguro para que pessoas negras possam relatar casos de discriminação no ambiente de trabalho.

A juíza também reforçou a importância de um olhar interseccional por parte do Judiciário, reconhecendo que opressões de raça, gênero, sexualidade e classe se entrelaçam e exigem respostas específicas. “Interseccionalidade não é um adorno teórico, é a realidade concreta de quem vive múltiplas opressões. O Judiciário precisa criar protocolos interseccionais, promover escuta qualificada e institucionalizar práticas de acolhimento”, ressaltou.

Por fim, a magistrada defendeu a ampliação da participação da sociedade civil na construção de políticas públicas dentro do Judiciário. Segundo ela, é fundamental criar canais permanentes de diálogo com movimentos sociais, coletivos e redes que historicamente denunciam o racismo institucional e reivindicam mudanças.

“O Judiciário não pode mais ser uma torre de marfim. Se queremos transformar a justiça em algo verdadeiramente público e acessível, precisamos incorporar as vozes populares, os saberes das periferias, dos terreiros e das aldeias. Nesta data, reafirmamos nosso compromisso com a construção de um futuro mais justo para as próximas gerações. Que o legado dessas mulheres negras nos inspire a seguir lutando, ocupando espaços e transformando estruturas e as narrativas. Caminhemos juntas, em roda, com as que vieram antes e com as que ainda virão”, concluiu.

Conheça algumas das mulheres negras que transformaram o Brasil:

Tereza de Benguela - Líder quilombola no século XVIII, comandou o Quilombo do Quariterê por duas décadas, resistindo à escravidão e abrigando mais de 100 pessoas negras e indígenas. É símbolo de luta e resistência.

Tia Ciata (Hilária Batista de Almeida) - Quituteira e mãe de santo baiana, foi peça-chave na origem do samba carioca, abrindo sua casa para músicos como Pixinguinha e Donga. Teve papel essencial na legitimação cultural do samba.

Carolina Maria de Jesus- Escritora, poetisa e catadora de papel, autora de “Quarto de Despejo”, sucesso editorial em 1960. Seus relatos sobre a favela deram voz a uma realidade silenciada.

Enedina Marques - Primeira engenheira negra do Brasil. Formada em engenharia civil no Paraná, enfrentou preconceitos e abriu caminhos para mulheres negras na engenharia.

Laudelina de Campos Melo - Fundadora da Associação das Empregadas Domésticas do Brasil, influenciou conquistas históricas como o direito à carteira assinada para a categoria.

Antonieta de Barros - Primeira deputada negra do Brasil, foi educadora, jornalista e defensora do acesso ao ensino superior para a população de baixa renda. Criou cursos de alfabetização e foi referência no combate ao analfabetismo.

Maria Firmina dos Reis - Primeira romancista negra do Brasil, autora de “Úrsula”. Fundou uma escola mista e gratuita no Maranhão em 1880, sendo também uma das primeiras do país.

Maria Felipa de Oliveira - Heroína da Independência na Bahia, liderou mais de 200 pessoas negras e indígenas em batalhas contra tropas portuguesas. Reconhecida oficialmente como Heroína da Pátria em 2018.

O TJPE reitera seu compromisso com a construção de uma justiça mais diversa, equitativa e plural, valorizando as trajetórias de mulheres negras que, com coragem e resistência, seguem transformando estruturas dentro do sistema de justiça.

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Texto: Ana Gicelly Nascimento  |  Ascom TJPE
Arte: Núcleo de Publicidade e Design   |  Ascom TJPE