Notícias

TJPE aprofunda capacitação em Justiça Restaurativa com curso avançado para situações complexas

Produção artística do autorretrato abriu caminho para as reflexões acerca das habilidades do facilitador

Quando a primeira turma de facilitadores em Círculos de Construção de Paz iniciou sua formação no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) em 2015, poucos imaginavam que essa iniciativa se tornaria um dos pilares da transformação do sistema de justiça no estado. Dez anos depois, o que começou como uma metodologia inovadora se consolidou como política institucional, fortalecendo vínculos, promovendo a cultura de paz e oferecendo uma alternativa eficaz ao modelo convencional retributivo.

O trabalho pioneiro foi iniciado na Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), em 2015, na gestão do desembargador Luiz Carlos Figueirêdo, e, em seguida, iniciou-se a aplicação de práticas restaurativas no Centro Interdisciplinar de Acompanhamento a Penas e Medidas Alternativas (Capema). Essa estruturação plural permitiu que a Justiça Restaurativa atendesse públicos distintos com necessidades específicas, mas sempre mantendo os princípios fundamentais de voluntariedade, confidencialidade e construção coletiva de soluções.

“As práticas restaurativas já começaram a ser usadas em casos de crianças e jovens, principalmente no Rio Grande do Sul. No TJPE, já tínhamos profissionais preparados e interessados, como Hebe e Arrais, além de uma sala que poderia ser adaptada. Também tínhamos na UFPE um dos maiores especialistas do Brasil no assunto, Marcelo Pelizzoli. Então pensei: por que não tentar aqui? Hoje, vendo o sucesso dessa experiência - que já faz parte da cultura do tribunal -, me faço uma pergunta diferente: por que demorei tanto para tomar essa decisão? Sou muito grato a todos que embarcaram nessa jornada e trabalharam para que desse certo”, declarou o desembargador Luiz Carlos de Barros Figueirêdo.

A institucionalização nacional da Justiça Restaurativa ganhou força com a Resolução CNJ 225/2016, que estabeleceu a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário. Segundo esta resolução, a Justiça Restaurativa é definida como "um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência".

E o TJPE deu mais um passo importante na capacitação de seus profissionais com a realização do "Curso de Aprofundamento da Formação de Facilitadoras (es) de Círculos de Construção de Paz – Situações mais complexas". O curso, com carga horária de 20 horas, contou com a participação de 20 servidores já formados em anos anteriores, respondendo tanto à demanda por conhecimento avançado quanto aos requisitos do Prêmio CNJ de Qualidade 2025.

Capacitação foi realizada na Escola Judicial do TJPE

Segundo a psicóloga Kátia Assad, instrutora e integrante do Núcleo de Justiça Restaurativa da Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), a trajetória de uma década de atuação e formação trouxe uma perspectiva única. "Foi muito enriquecedor para nós, instrutoras, participar deste Curso de Aprofundamento. A cada formação que ministramos, podemos revisitar a nossa prática e conceitos, nossas intenções e motivações nesta jornada da Justiça Restaurativa dentro do Judiciário pernambucano, que iniciamos há uma década. Mas essa turma traz algo de muito especial, pois reuniu servidoras e servidores das turmas anteriores, de 2022 a 2025. Rever cada uma destas pessoas, acompanhar suas trajetórias e perceber que estamos todos juntos em busca do fortalecimento da Justiça Restaurativa do TJPE é muito gratificante."

A Justiça Restaurativa no TJPE também se destaca por sua capacidade de articulação em rede, estabelecendo parcerias com instituições como a Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase), Secretarias de Educação municipal e estadual, e organizações como a ONG Ruas e Praças, que promove ações sociais com crianças e adolescentes em situação de rua e em vulnerabilidade de direitos.

A expansão da Justiça Restaurativa para além dos limites institucionais do Judiciário demonstra o compromisso com a transformação social. Iniciativas como os Círculos de Construção de Paz realizados em escolas e comunidades têm contribuído para a prevenção de conflitos e a promoção de uma cultura de não-violência. Em 2022, o CNJ reforçou essa abordagem ao acrescentar o artigo 29-A à Resolução CNJ nº 225/2016, enfatizando a importância de projetos em parceria com escolas.

A trajetória de dez anos da Justiça Restaurativa no TJPE representa não apenas a consolidação de uma metodologia de transformação de conflitos, mas possibilidade de mudança de paradigma na forma como o sistema de justiça aborda as situações de violência e criminalidade. Ao priorizar o diálogo, a responsabilização, a compreensão mútua e a reparação dos danos, o Judiciário pernambucano tem contribuído para a construção de uma sociedade mais justa, participativa e pacífica.

A iniciativa representa um marco na qualificação profissional do Judiciário pernambucano. Sandro Vila Nova, gerente da unidade judicial da 2ª Vara de Medidas Protetivas de Urgência da Capital, testemunhou a transformação proporcionada pelo curso: "O curso de aprofundamento proporcionou uma prática maior do que aquela do curso de facilitadores, pois permitiu que eu enxergasse a justiça restaurativa de uma maneira mais profunda e mais completa. Muito gratificante participar e é estimulante para continuar nessa caminhada”.

O desafio para os próximos anos é ampliar ainda mais o alcance dessas práticas, qualificar novos facilitadores e integrar a Justiça Restaurativa de forma mais efetiva ao cotidiano jurisdicional. Como ressaltou Kátia Assad em seu depoimento, o fortalecimento dessa política depende do engajamento coletivo de todos os atores envolvidos, unidos pelo propósito comum de construir novas formas de promover justiça e paz social.

 

...........................................................................................................
Texto: Ana Paula Santos | CIJ TJPE
Fotos: cortesia